sábado, 22 de junho de 2013

O Caos.

"Ah: fumarás demais, beberás em excesso, aborrecerás todos os amigos com tuas histórias desesperadas, noites e noites a fio permanecerás insone, a fantasia desenfreada e o sexo em brasa, dormirás dias adentro, faltarás ao trabalho, escreverás cartas que não serão nunca enviadas, consultarás búzios, números, cartas e astros, pensarás em fugas e suicídios em cada minuto de cada novo dia, chorarás desamparado atravessando madrugadas em tua cama vazia, não conseguirás sorrir nem caminhar alheio pelas ruas sem descobrires em algum jeito alheio o jeito exato dele, em algum cheiro o cheiro preciso dele.Que não suspeitará de tua perdição, mergulhado como agora, a teu lado, na contemplação dessa paisagem interna onde não sabes sequer que lugar ocupas, e nem mesmo estás.

Na frente do espelho, nessas manhãs maldormidas, acompanharás com a ponta dos dedos o nascimento de novos fios brancos nas tuas têmporas, o percurso áspero e cada vez mais fundo dos negros vales lavrados sob teus olhos profundamente desencantados. Sabes de tudo sobre esse possível amargo futuro. Sabes também que já não poderias voltar atrás, que estás inteiramente subjugado e as tuas palavras, sejam quais forem, não serão jamais sábias o suficiente para determinar que essa porta a ser aberta agora, logo após teres dito tudo, te conduza ao céu ou ao inferno. Mas sabes principalmente, com uma certa misericórdia doce por ti, por todos, que tudo passará um dia, quem sabe tão de repente quanto veio, ou lentamente, não importa.Só não saberás nunca que neste exato momento tens a beleza insuportável da coisa inteiramente viva."
Caio Fernando Abreu.


E de repente, vem de dentro aquela incessante vontade de errar, de vagar, de cair pelo mundo sem rumo. De gritar, de questionar, de voltar no tempo, rasgar-se  novamente - e sempre, fazer tudo igual mas de forma diferente, e reconstruir aquilo que simplesmente se desmanchou no ar - e você não sabe por que.

Não sabe por que não entende como podem as coisas terem começo-meio-e-fim em tempos diferentes para pessoas diferentes. Não sabe porque não entende - e não aceita- que o fim dele chegou antes do seu. Não entende como podem dois universos se fundirem e se partirem com tanta facilidade. Não suporta imaginar que a sua dor lateja enquanto a dele sequer existe. Acha injusto, se rebela, se debate, se questiona, tenta se apegar a detalhes e resquícios do passado, que só servem para esfregar na sua cara que o presente não faz sentido.

E aí não tem pra onde fugir, nem como se esconder. Você sabe que só vai esquecer o castelo de areia que a vida lhe implodiu com um tapa quando construir outro castelo, mas castelos não se constroem do nada, e nesse meio tempo você sofre. Se contorce,  se debate. Sente a vida amarga, correndo em forma de calafrio pela espinha. Sente ódio quando na verdade sabe que tem amor. Substitui a lacuna da ferida aberta no coração pela raiva, pela amargura, pelo maldizer. Sente-se um lixo por dentro enquanto tenta sorrir.

E a pergunta que sempre fica no ar é "por que"? Por que comigo? E aí a garganta seca, e o silêncio lhe responde. É porque é. Foi porque foi. Bem vinda à vida. E quanto mais alto o vôo, maior a queda. E você vai se sentir calejada, não vai mais querer sofrer isso nunca mais. Vai negar, vai ser fria, vai tratar pessoas como objeto, vai criar uma casca blindada para não se ferir - e com isso também deixará de sentir. E nunca mais construirá castelos de areia, mas apenas amontoados de pedras disformes.

Vai se jogar no caos, na esbórnia, na balbúrdia, vai perder o foco e errar a mão. Vai se perder, e perdida, se afogar cada vez mais na própria solidão. É que a vida, minha cara, é ingrata pra quem sente. É ingrata para pessoas como você, sentimentalóides e românticas. A vida é feita para quem mente, para quem engana, para quem pisa e passa por cima. Não para gente como você. Mas você nuca vai mudar, não é verdade? E enquanto o outro ri, você sofre, mas um dia a própria vida dará o troco - para  o outro e para você.