sexta-feira, 20 de dezembro de 2013

Preconceito à Feliccianna

É nojento. Nojento, e repugnante. Não é nada natural, não! Não é e não pode ser. Eu não consigo entender como existem pessoas que podem comer queijo. Queijo é leite podre! 

Não, tudo bem. Se existem algumas pessoas doentes que realmente sentem prazer em comer queijo, que o façam... Mas não na minha frente, né? Nem em público! Cada um faz o que quiser com o próprio corpo, digo, a própria boca, desde que entre quatro paredes. Não sou obrigado a ver isso!

E outra, o que as crianças vão pensar? Imagine se meu filho vir alguém na rua comendo queijo? Como vou poder explicar para ele que aquilo é abominável, é errado, mas ainda assim tem gente que faz?

Não, veja bem: eu não tenho nada contra quem gosta de comer queijo. Só não acho que isso deve ser incentivado assim, né... O que esse povo quer é uma ditadura do queijo! Querem fazer lavagem cerebral na criançada pra que todo mundo aprenda a comer queijo. Cara, que absurdo! Não vêem que isso é errado? E além disso, é sabido que queijo causa esterilidade. Se ensinarem nossas crianças que comer queijo é bom, todo mundo vai comer queijo e o mundo não vai mais se reproduzir! Daí a humanidade acaba!

Claro, tem pessoas que gostam de comer queijo mesmo tendo sido criadas em famílias que detestam queijo. Há pais que mesmo nunca tendo sequer tocado uma muçarelazinha de leve têm filhos que são alucinados por gorgonzola e outros queijos azuis - ECA! Mas, então! Se sem ser incentivado já é assim, imagine só se for! Loucura! Cara, não pode ser.

Não, cara. Não tem nada a ver. Comer carne não é igualmente nojento, porque carne é natural! A gente nasce sabendo que carne é bom, e além disso, tá na bíblia. Não dá pra querer comparar uma coisa com a outra. E outra, pode ver, 90% da população adora comer carne e detesta comer queijo. Se fosse natural comer queijo, então pelo menos metade das pessoas no mundo iria gostar disso, não acha? Mas, sabe, eu não tenho preconceito... Acho que se querem legalizar esse negócio de comer queijo, tudo bem, mas podiam então fazer um plebiscito, né? Aí o povo vai - democraticamente - escolher se isso é ou não bom. 

Como assim isso não pode ser feito?Tá maluco, cara? Você tem medo da democracia? Ora, não é questão de submeter o direito de uma minoria já marginalizada e oprimida ao beneplácito de uma maioria preconceituosa, isso é democracia, cara! 

Não, eu não sei por que a Princesa Isabel não fez um plebiscito para abolir a escravidão. Mas devia ter feito, né? E se a maioria dos eleitores - que na época eram só brancos, já que escravo não votava - escolhesse pela manutenção da escravidão? Ora... É a democracia né, meu!? Não tem muito jeito não...

Não, cara. Não posso aceitar isso... Pessoas não podem sair por aí comendo queijo como se isso fosse normal! Eu sinceramente acho que isso é questão de criação, cara... Faltou a molecada levar uns tapas quando era pequena pra aprender que comer queijo é errado. É que a sociedade de hoje é muito cheia de frescurada! Nem educar os filhos a gente pode mais!

quinta-feira, 5 de dezembro de 2013

Efêmero

Foi quase. Quase um desespero, um grito abafado, quase um soluço. Foi quase uma vida, foi quase um amor. Quase deu certo, por pouco não rolou. Foi assim, foi quase. A vida inteira dele havia sido quase. Quase triste, quase feliz, quase lindo, quase quase.

Quase se formou, quase teve um bom emprego, quase foi promovido, quase se casou.

E a ânsia medonha desse meio-termo xôxo era o que mais o afligia. Seja quente ou seja frio, porque se for morno, eu te vomito. Mas era morno e ele sequer conseguia vomitar. Ser obrigado a conviver com a própria mediocridade dia após dia é uma pena pra lá de cruel. É desumana.

A teoria do caos diz que o bater das asas de uma borboleta pode gerar um tufão do outro lado do mundo. E se fosse assim? E se uma borboleta tivesse batido as asas em algum momento lá no passado? E se ele não tivesse nunca ido àquela festa? Ou acertado aquela última questão da prova? Se ela nunca o tivesse convidado para sair? Se ele nunca tivesse quase se apaixonado? E se ela nunca tivesse quase tentado fazer dar certo? E se eles nunca tivessem quase se casado?

O medo não é da altura, é da queda. Andar na beirada não é o problema, não cair e nem recuar é que é. A vida é breve, ou quase breve. Todos são ótimos em alguma coisa e horríveis em tantas outras. Extremamente bem sucedidos nos negócios, uma negação no amor. Genial com números e uma aberração com palavras. Um gênio da prosa e uma mula dos cálculos. Ele não. Ele era mediano em tudo. Era nota cinco. Era insosso, era cinza. Era despercebido, era quase. 

Era quase, e ser quase na vida foi a sua sina. E a vida inteira, quase viveu. E quase viver é pior do que morrer.