sábado, 16 de julho de 2016

Julie

Era só mais um diálogo trivial. Eu ali, forte, sereno, conversando como quem comenta uma notícia de jornal.

É estranho, eu disse. É como se houvesse uma estranha empatia com quem nunca conheci, uma saudade de algo que nunca vivi, uma ternura por alguém cuja mão eu nunca, nunca segurei... Uma vontade estranha de chorar, e...

- Chora! Ela interrompeu, segurando a minha mão com uma ternura que nunca conheci. Olhou fundo nos meus olhos e disse: chora, Gá. Chora.

Chorei. Chorei tanto... E nunca chorar foi tão bom. Nunca soube exatamente a razão, nunca tive a menor ideia de por que aquilo me tocara tanto. Mas chorei. E nunca chorar foi um alívio tão reconfortante... 

Foi-se. Não disse adeus, simplesmente foi. Mal a conheci, mas sua dor também em mim doeu - estranho. Foi-se. Quis ir. Enquanto tantos lutam para ficar, ela escolheu partir. Eu não a culpo, não cabe a ninguém culpar esse gesto, porque ninguém sabe o desespero que é querer partir e se obrigar a ficar. Ela se foi. O sol de hoje, ela não viu raiar. Ela se foi porque quis, foi para se deitar e ser enfim feliz, sem se levantar. Sem nunca mais sentir, fechou os olhos para sonhar, sua alma então gritou, e quem ficou não pôde ouvir - a quem ficou só restou chorar.

É estranho porque tudo o que sei dela é o seu nome: Julie. Seu nome, e nada mais. Não a conheci. Nunca a vi. Mas seu nome, e sua triste história, me tocaram. E é estranho, porque parece que há algo que nos conecta. Mais do que achar que eu compartilho do seu desespero (quanta petulância minha! Quem sou eu para compartilhar do desespero de quem não conheci?), meu peito sufoca de um jeito estranho quando sinto, sem querer sentir, uma vontade também estranha de segurar a sua mão, de abraçá-la demoradamente enquanto falo bem baixinho ao seu ouvido: hei! Calma. Calma que tudo se ajeita. Calma que se a dor o peito estreita, o tempo cuida de afrouxar. Calma. Eu sinto aqui pulsar seu peito, no meu peito, sincronizando a pulsação.

Sua mão. Eu queria ter podido segurar a sua mão. Eu queria ter podido lhe abraçar, secar suas lágrimas. Eu queria ter podido ouvir a sua dor. Eu queria ter podido dividir a sua agonia. Eu queria tê-la conhecido um dia. E hoje, já não bate mais seu coração – o coração que não conheci. Por que partiu? Por que parou? O mundo precisava de você. Eu precisava também, sem nunca ter sabido, mas você foi antes, quis ir além, e a gente nunca se encontrou... Eu não lhe conheci... E você partiu