quarta-feira, 25 de setembro de 2013

Bom dia

Eram 7h48m. Faltavam 2 minutos para o despertador vociferar em sua orelha, mas ele já estava desperto. Os olhos perdidos fitavam os números das horas, enquanto o corpo se deixava prostrado na cama. 

Não queria levantar. Não queria sair daquele pedaço de ilusão aconchegante. Não por medo do dia - que raiava lindo do lado de fora das janelas fechadas - nem tampouco por medo da vida. Na verdade, ele não conseguia definir direito o que era aquela necessidade medonha de ficar sozinho, de fechar-se para o mundo.

Pensou que seria cômico sentar-se na cama, acender um cigarro e abrir uma cerveja. Não, não era o que ele tinha vontade de fazer, mas de alguma forma ele achou que seria uma cena interessante de interpretar. Bancar o boêmio intrépido, o poeta alucinado e verborrágico que desperta o fígado com um tapa na cara às 8h da manhã enquanto destila milhares de versos perdidos, rimados, angustiantes e apaixonados.

Imaginou-se com os cabelos desgrenhados, a barba por fazer e o olhar blasé fitando o horizonte estampando capas de revistas cult em bancas de jornais descoladas. Imaginou-se sendo lido nos botecos mais sujos, e nos bares mais requintados.

Talvez por isso não quisesse sair da cama. Estava sonhando acordado, e aquilo lhe dava um imenso prazer. "A vida inteira que podia ter sido e que não foi..." murmurava entre os lábios ressecados pela sede e pela preguiça de buscar um copo d´água. 

Queria ser lido. Queria ser consumido, musicado. Queria ter seus poemas todos publicados, e viver da arte. Morrer cedo, ser visceral. Atirar-se de cabeça na vida, dizer adeus à solidão e à mediocridade. Acordar antes do despertador, e ter vontade não de sair da cama e fazer a barba, mas de sentar-se nela e escrever uma obra prima.

Mas sonhar acordado não enche barriga. Pulou da cama, já atrasado, fez a barba, vestiu o terno, deu o nó maquinal na gravata e foi trabalhar. Melancólico e vertical.

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